O Velho Pinheiro

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Os avós Pinheiro

Se fechar os olhos ainda posso sentir o vento fresco que cortava a cidade nos dias quentes de verão e voltar no tempo, a pouco mais de  trinta anos, onde ela ainda mantinha ares de  interior.
Lembrar de rostos conhecidos que passeavam nos finais de tarde ensolarados pelas ruas calmas do centro, personagens que por ela trafegavam deixando suas histórias.
Quem dos filhos antigos da terra, nunca ouviu falar de Álvaro Francisco Pinheiro ou simplesmente Seu Pinheiro da pedreira?
Chegou a Macaé por volta de 1919, com a esposa Dona Leopoldina Neves Pinheiro ( carinhosamente chamada por todos de Dona Lili ) com quem fora casado por mais de sessenta anos e três, dos oito filhos que tiveram.

Residiu por muitos anos numa antiga casa na Rua Presidente Sodré, a conhecida  Rua da Praia, ao lado de um ponto de ônibus. Hospitaleiros como eram. a família sempre acudia às senhoras com crianças  pequenas que se negavam a freqüentar as imundas latrinas  do local.
Quando a Estação Férrea Leopoldina se instalou na cidade, trabalhou como condutor no tempo dos ingleses, homens sempre rigorosos com o tempo. Numa de suas viagens a Niterói perdeu muito tempo numa pequena estação e para tirar o atraso acelerou tanto que acabou por chegar com o trem antes do horário previsto.
Para ficar mais próximo da família resolveu deixar a Leopoldina e trabalhar como Guarda-livros em Taboada & Cia, depois como contador em vários estabelecimentos comerciais onde deixou sua marca registrada no capricho da caligrafia feita em bico de pena nos livros Caixa, que hoje são relíquias que deveriam ser mostradas aos estudantes de ciências contábeis e como tesoureiro da prefeitura na administração do então prefeito Ivair Nogueira Itagiba, prefeito que ficou conhecido por embelezar a orla da Rua da Praia,
Há de se deixar registrado um episódio muito interessante desse período, quando seu Álvaro chegou para o prefeito e lhe disse que não mais havia verbas para o termino da obra, que até então tinha sido feita somente com os recursos da cidade.  Então o prefeito mandou  tirar todas as grades que circulavam a Praça Veríssimo de Melo, pois eram grades de ferro e valiam um bom dinheiro, assim fazendo arrecadou-se o suficiente para que a orla fosse então terminada e mais tarde inaugurada já no governo de Dr. Télio  Barreto.
Homem muito organizado e de visão, resolveu apostar todas as suas economias num pedaço de terra alagada no bairro Miramar que fazia suas divisas com estação férrea e o morro de Santana. Onde hoje se localiza o Bairro Pinheiro
Todos diziam "- Pinheiro! Que péssimo negocio!"
Mas Seu Álvaro tinha lá seus planos naquele pedaço de chão e resolveu comprar assim mesmo, só que ainda não tinham em mãos os quinhentos réis pedidos pelo proprietário, o que lhe deixou bastante frustrado.
Ao chegar a casa, queixou-se com Dona Lili,  que  prontamente lhe disse:
– "Calma... Álvaro!  vem comigo..."
E  indo até a cozinha da casa, tirou de um pote acima no armário a quantia que faltava, suas economias de anos.com venda de doces.
Saneou as terras, queimou choupanas abandonadas por antigos doentes de tuberculose e formou um lindo sítio.
Mas uma vez o destino lhe brindava com a sorte, ao cavar um poço nas proximidades da pedreira, encontrou águas puras, maravilhosas, e resolveu então batiza- la com o nome de " Da  Baronesa" .
Ao longo do tempo a fama dessas águas correu a cidade e o casal Pinheiro servia de bom grado a população, pois a água era de ótima qualidade. Mais tarde cavou outro poço ao lado da casa e delas se serviram famílias ilustres como os moradores do Castelo, a família Lima e Silva, a família Sales, Michel, Tâmega , Guedes , entre outras.
Além do poço o casal fez uma bela horta que abastecia  a comunidade com uma grande variedade de hortaliças e frutas.
Com a aposentadoria, a pedreira que ficava dentro da sua propriedade passou a ser sua fonte de renda. A velha  ponte sobre o rio Macaé recebeu muitos caminhões de pedras tiradas de lá  graciosamente. Empregava muitos rapazes para com pesadas marretas transformar pedras brutas em pedras britadas para assim atender as construções que se erguiam na cidade.
Mais tarde, loteou parte dessas terras, formando o bairro de Santana e parte do Miramar. Depois de seu falecimento a área que abrigava a chácara também foi loteada, surgindo então o bairro Jardim Pinheiro.
Seu Pinheiro atuou também na política macaense tendo sido presidente do partido PSP( Partido Social Progressista), chegando a trazer Ademar de Barros a Macaé, quando candidato a presidente da República. No antigo campo de aviação, onde hoje casas se amontoam, Ademar de Barros desceu de um bimotor, distribuindo sorrisos e balas para as crianças fascinadas pelo pequeno avião.
Gostava de se manter atualizado, e quando não mais podia freqüentar o Belas  Artes, conhecido bar e restaurante da cidade, reduto dos políticos e intelectuais da época, por não ter como se locomover até lá devido a idade, acompanhava de casa as noticias nos jornais, no rádio e na TV  que muito o admirava
– "Como pode?" dizia ele rindo, – "O que mais vão inventar?"
Nunca acreditou que o homem tivesse chegado à lua e dizia:
– "Isso é uma montagem em filme dos espertos americanos".
Com mais de oitenta anos  ainda podia ser visto caminhando pela cidade, com seus tradicionais suspensórios, chapéu e bengala para ir à barbearia.
Era um excelente contador de "causos", e prendia a atenção  por horas dos amigos que por vezes  davam um jeitinho de dar uma paradinha na chácara para uma prosa e um delicioso cafezinho servido na   grande varanda  da casa.
Nunca recebeu o titulo de cidadão macaense, virou apenas nome de rua, assim como também o de sua esposa Dona Lili,  mas sempre falava que  seu amor por essa cidade é o que contava.
Morreu dia 04 de março de 1979, e foi sepultado no jazigo da família em Santana e até nesse fato seu Pinheiro  deixou  história. Suas terras faziam divisas com o cemitério que pertencia à igreja. Como este era muito pequeno e já não mais comportava outras sepulturas, foi então procurado pela Irmandade que lhe propôs  uma troca. Um espaço para a  ampliação  por uma sepultura permanente.
O jazigo da família encontra-se lá ao lado de  outros   macaenses ilustres.