A poesia de Glória Salles

“Dos sentidos”

Lanço-me alucinada nos braços da poesia
Prontamente a palavra acesa me abraça
Vultosas quantias de sentenças propícias
Arrancam-me do pantanoso chão da inércia

Impetuosa, rabisco qualquer bobagem crua.
Relatos alucinados desta artéria dilatada
Metáforas colhidas no chão da memória
Golpe afetivo que saturou o olhar ausente

Porem os versos vagam por maré qualquer.
Motivados pelo apelo azul de outras praias
Querem fecundar o sonho noutras paragens
Ganhar o céu, nas asas de famintas gaivotas.

Fico, envolta no lençol púrpura desse ocaso.
No fugitivo instante que o silencio oferta...

Glória Salles

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“Meu silêncio”

Um fio tênue separa a razão do insano
Na busca por mim, cromáticas trepidações.
A mercê das palavras, cacei o caminho.
Desejando a solidão que há tempos me seduz

Embora o barulho marche nas alamedas de mim
É o silencio que espero, em difusos sonhos.
Quero minha companhia e me ver por inteiro
Sem o funesto flagrante que reverbera utopias

Hoje quero tecer horas de manhosa solidão
Escavar lento sem aferir meus horizontes
Desatar o cordel de todos os meus atados nós
Quero sem permissão meus rios fluindo livres

Persigo a convicção de que neste impasse
Não seja meu tempo apenas sobra de horas.

Glória Salles

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“Pura magia…”

É quando a tarde taciturna agoniza
Que retrocede o suspiro e arde a inquietação
A brisa suave traz o cheiro doce da noite
No brilho da lua fragmento de minha essência

Seu encanto é um convite e mergulho louca
Sorvendo o silencio que a luz dourada oferta
Apascenta, rege minh'alma num sonho embalado.
Induzindo o poema a diluir-se nos braços da paz

Gosto da noite e da sua companhia insólita
Que salpica fulgente e em meu olhar transborda
Junta os estilhaços que talham feito açoite
Qual vinho envolvente minh'alma embriaga.

Nessa mistura de magia não sei contar o tempo
Num etéreo ócio nem percebo, a aurora que nasceu.

Gloria Salles

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“Dança comigo...”

O brilho solícito no olhar fascinante
Deslizar nos acordes sutis da sinfonia
Sensual caricia em harmonioso ritmo
Inconfessável sussurro, canto que inebria.

Sedutora fragrância faz o sangue ferver
Precisão de movimentos, linguagem poética.
E a mão quente espalmada nas costas nuas
Faz perder o tino, entorpecer, esquecer a ética.

O olhar dentro do olhar desnuda a alma.
Os corações pulsam no mesmo compasso
O enroscar de pernas provocando arrepio
A sinfonia da ternura conduzindo os passos

O beijo esperado prolonga a mágica hora
Emoção e paixão fazem o tempo de agora...

Glória Salles

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“Nostalgia da chuva”

Através da vidraça vejo o céu sombrio
A chuva torrencial chegou sem chantagem
O vento sorrateiro sopra um recado
Sua mensagem foge a minha concepção

Olhando os pingos, pensamentos vagos.
Nos vácuos dos versos, nenhuma rima.
O cheiro de terra molhada acorda o desejo
De nesta estrada imensa andar sem rumo

Coração queima, pulsa pelo que nunca veio.
Restringindo-me o ar que embaça a vidraça
Quer ser a gota perdida que escorre da hera
A esperança ritmada de alcançar o oceano

No ruído cadenciado desta festa de pingos
Fantasio ver o sol por uma fissura de nuvem

Glória Salles

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“Fim da linha...”.

A viagem tinha destino, só seguir o roteiro.
Curtir a paisagem rumo ao trajeto sonhado
Porem em seu longínquo e confuso mundo
Partiu do trem em movimento aos braços de Deus

O teto, antes aparentemente estável e firme.
De repente são escombros e cacos espalhados
Nos trilhos da inquietação a alma soluça...
Margeando o coração, sangra a ferida aberta.

A dor da perda nos aprisiona os sentidos
Faz-nos impotentes, ata os movimentos.
Ressentidos, queremos de volta o passado.
Num lento e dolorido vôo, burlar o calendário.

Na frustrada tentativa de atrasar o relógio
Só resta o baque insano e o choro côncavo...

Glória Salles

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"Um dia de cada vez"

São bocados de lembranças atadas ao tempo
Que parecem não ter forma, ambiente, se quer cor.
Ensurdeço nesta ânsia de atrasar o tal momento
Desejo uterino de ouvir o pulsar, sentir o calor.

Nossos opostos acumulados eram emoção e razão
Feitas da mesma matéria éramos causa e efeito.
Hoje meu olhar vaga, nada assimila com exatidão.
É meu coração pulsando, agora fora do peito.

E fica uma sensação de busca interminável
Parece esquina errada, assunto mal acabado.
Hoje, metade de mim domina a dor implacável.
E a outra metade abraça um ser fragmentado.

Munida de força e fé, acredito com altivez.
Sustentando esta saudade, um dia de cada vez.

Glória Salles

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“Incognita ilusão”

Fecha-se em círculos às vezes o pensamento
Mobilizando minha razão que fica perdida
Confundem-se, num bailado em movimento.
Aí me vejo desarmada, visão tão distorcida.

Feito sombra que vaga débil, ditado disperso.
Imprecisa, sou epigrafe varrida, indefinida.
Feito aquarela ilegível borrando cada verso
Ilusão incógnita que reveste a alma ferida

Os silêncios querem ecoar na voz rouca
Que emudecida asila o que o destino teceu
Subsiste porem à lembrança doce e louca
Que o meu olhar disperso em vão procura

Oscilando nos pensares de ontem, do presente.
Deixo que a lucidez atípica, meu sonho ostente.

Glória Salles

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“Promessa de alvorada”

Não sei aonde esses trilhos me conduzem
Fiquei a esmo, na interminável caminhada.
Perdi a bússola que orientava o meu rumo
No meu olhar extensa incerteza cinzelada

Pelo vão do caminho abandonei as palavras
No hiato das frases ficou o silencio ocultado
Meus barulhos assumiram a mudez do verbo
Ficou o ruído da alma no secreto som abafado

O sereno da noite orvalha minha lembrança
As mãos hábeis da noite afagam a esperança
Fantasias opacas ganharão luz na alvorada.

Ando, amparada pelo odor almíscar da noite.
Ainda que o frio me puna e sinta do vento o açoite
Romperá com meu sorriso esta manhã raiada.

Glória Salles

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“Página branca”

Meu coração se apressa em te lembrar
No raro encanto que teu olhar encerra
O calor do teu afago a me queimar
Restringindo a tortura dessa espera

Deusa de tuas noites, apenas quero
Enlanguescer perdida no teu abraço
Aspirar todo encanto, que com esmero
Ofereces no aconchego do teu regaço

Vem, leva o inverno que em mim mora
Quando da tua ausência, farta me vejo
Traz teu olhar, que meus sentidos aflora
Entontece-me com a fúria do teu desejo

Toma meus sonhos nos lençóis de cetim
Sou tua página branca, rabisca em mim

Glória Salles

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“Meu verso é livre”

Meu versejar é livre feito o vento
É barco à deriva em mar aberto
É muro de arrimo ao sentimento
Mas rejeita da mordaça o aperto

Não tem a pretensão da lógica fria
Destoa muitas vezes da imagem
Põe tempero em excesso na magia
Ou é irreverente, franco e selvagem.

É convite à aspiração do meu instinto
Como um zaino solto na invernada
Exonera-se à vertigem do labirinto
Verbos no peito tecidos, brasa alastrada.

Quero os versos assim, desaguando em foz.
No fertilizar das palavras, expandir a voz...

Glória Salles

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“Chove amor em nós…”

Quero dias recheados de pura languidez
Sem limitar momentos, amar-te sem hora marcada.
Ser recompensa, não questionar se é insensatez.
Só ver-me nos teus olhos límpidos, mergulhada.

E na privacidade perigosa do teu quintal
Dar-te tudo de mim, entregue... Suplicante.
Sem preço, sem medo de um precipitado final.
Por temer ser essa, uma paixão rompante.

Desses nossos momentos na chuva, quero mais
Porque esse amor ao vento, não apaga nosso fogo.
E a brisa, acende o braseiro ainda mais...

E que venha mais dessa emoção quase palpável
Quero senti-las, no som da tua voz ofegante e rouca.
- Quero mais de você, nesse futuro viável.

Glória Salles

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“Vento peregrino”

O gemido da noite nas frias madrugadas
Acordam a tormenta que a alma abriga
Sentimento alado, emoções sem vagas
Laçam-me o coração, pondo - me perdida

Então decidi vagar por tudo o que sei
Flutuo em transe, deixando-me seduzir
Em perfumados risos meu silencio calei
No cheiro de manhãs com gosto de porvir

O canto etéreo do vento parece entender
O apelo suplicante, profundo do coração
Que no manancial de cores quer se perder
Caçando tantos sons peregrinos nos vãos

Acordo com a voz quente que causa arrepio...
Adormeço na boca que adoça e me põe no cio.

Glória Salles

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“Das andanças de mim”

Quando o sol em pranto se derramou
Então serenei das andanças de mim
O errante percurso selou a procura
Das sandálias surradas, o andar cessou

A rima dos versos perdi no trajeto
A musica do destino dancei sozinha
Nos acordes que acordam os sentidos
Renovei emoções, rabisquei o projeto

Cedendo ao abraço do (re) começo
Apostei no calor do afago lascivo
Destruí a tramela da porta cerrada
Reconstruí as vontades que conheço

Espero a noite, que chega irreverente
Quando nenhuma palavra é inocente...

Glória Salles

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“Lavar a alma”

Em cada pingo da chuva as suplicas emudecidas
Falta cifrada fragmentando ávidas expressões
No céu azul das certezas mensagens esmaecidas
E a chuva mansa, promessa de trazer redenções.

Dos meus sótãos, tantos fantasmas despertam.
Evocados por lembranças aprisionadas no peito
Trazem a tona questionamentos que sonorizam
Endereços que perdi de momentos tão perfeitos

Reluto em deixá-las ir, ficam resquícios em mim.
Lacônica avaliação de tantas respostas utópicas
Temas estilhaçados, destroços de um folhetim.
Que arrastei pela vida, frias imagens retóricas.

Quero caminhar na chuva, cabelos em desalinho.
Lavar a alma, deixando todo o peso pelo caminho.

Glória Salles

********************

“Assim sendo, gritei...”.

Porque o silencio já não aquece a alma
E nas tramas das letras já não me acho
As linhas titubeantes já não são o tema
E absortas perdem-se no enredo do poema

Não quero rima nas letras entrelaçadas
Nem a caricia da trova que o verbo soletra
Quero a realidade autêntica da inteireza
Que do interior dos olhos se espalha no vento

Sacar do bolso da alma melodias sibiladas
Contracenando as cores do perfil do dia
Num vôo lamber do ser os cândidos lençóis
Pertencer-me assumindo todos os sismos

E ainda que o olhar ostente inquietação
Que a tez das palavras mostre-me inteira

Glória Salles

********************
“Onde mora a esperança”

É sonho de consumo a liberdade
De quem é aprisionado por grilhões
Prados estéreis, nula identidade.
Escravo andarilho entre milhões

Infértil procura que leva ao nada
Se em tanto fel a vida se afoga
Novo começo é verdade que brada
Cospe da veia o veneno da droga

Não pode ter força o percalço do rumo
Nem o peso do caos lhe fazer recuar
Siga na marcha que te põe no prumo
Bendiga a luz na vidraça a brindar

A fé renovada nutre a confiança
Ali no horizonte mora a esperança

Glória Salles

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“Do que escrevo”

Meus escritos são sobre a vida
Do movimento deste ciclo intenso.
Da história bem ou mal vivida...
Do momento raso, e do instante denso.

Escrevo quando sinto o beijo da aragem
Ou se fustigantes ventos me agitam
Do amanhecer, da perfeição desta imagem.
Ou se os mais secretos sentimentos gritam

Falo da fantasia que alimenta o coração
Camuflada nos tópicos da minha realidade
Falo das tormentas que entremeiam a emoção
E da placidez vagando a minha verdade

E é na multidão densa da minha solidão
Que deixo o verso expor a nudez do coração.

Glória Salles

********************
“Sua...”

Você com essa sua fome de me acolher
Selvagem, tira-me o ar, me desatina.
Sou fêmea que se permite prender
Faz-me sua, submissa, me domina.

Amo as mãos que me queimam o corpo
Minhas carnes macias aperta com luxúria.
Perde-se entre minhas fendas, absorto.
Ora saboreia lento, ora com lascívia e fúria.

Ferve-me o sangue ser assim submissa
E te arrancar sussurros e gemidos
Quando com dedos hábeis me atiça
E me invade enlouquecendo os sentidos

Toma-me assim, sempre com essa ousadia

Desse jeito seu que me faz te querer todo dia.

Glória Salles

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“Uma chama de lembrança”

A chama crepitando à minha frente
Acordam a memória em meus olhos
E a saudade espalmada me abraça
Tecendo nuances na emoção muda

No profundo silencio o suspiro borda.
Teu nome no tear da minha lembrança
E na linguagem das mãos, a confissão.
Que desmente o olhar frio da razão

Transgrido o firme intento da lucidez
Que no peito vazio grita inutilmente
E me entrego ao atroz açoite do delírio
Desejando outra vez o corpo quente

Consciente que meu coração vadio
Quer aos ouvidos o acalanto da tua voz
E perseguirá teu rastro sem descanso
Na solidão secreta dos meus dias...

Glória Salles

********************
“Presenças ausentes”

A canção das águas toca a baía
E se faz espelho do horizonte rubro
Que se despede do esplendido azul
Nesta hora mágica o silencio é benção

A cálida tarde convida, sugere.
O delírio de segurar os sonhos
Que se ajeitam dentro da alma
Entorpecidos em intimas paragens

Caminho, lenta por meus poentes.
Acompanhada de ausentes presenças
Despeço-me do dia, da solidão escoltada.
Recebo o palato blues do ocaso dolente

Fotografo na retina o lirismo do cenário
Entrego-me silente à poesia da noite
Coração acalentado pelo ruído do mar
Promessa sutil de manhãs de sol e sal

Glória Salles

********************

“Fome no olhar”

Esse teu olhar de fome, perigo iminente
Coração indomado sabe o risco que corre
Quer o sabor da boca, o sangue quente
Os sentidos tombados é isso que escolhe

Perde-se na volúpia dos beijos ardentes
Desvenda os mistérios deste teu olhar
Alvo de tuas mãos, gestos efervescentes
Enrosca-se em meu corpo, tira-me o ar

Tua boca, perdição que é também lenitivo
Sorve o gosto deste prazer louco, abdutivo
Decora meus contornos, tamanha sede...

Esqueço as horas, descanso em teu peito
E lascivo, teu olhar se alonga, satisfeito
No meu olhar feliz, preso em tua rede...

Glória Salles

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