Petróleo e caos urbano

A falta de mobilidade urbana nas grandes metrópoles do chamado Terceiro Mundo é hoje algo inimaginável sob o ponto de vista da racionalidade e do planejamento. O mar de veículos que se arrasta preguiçosamente pelas ruas e avenidas observado especialmente nos períodos de grande movimento é fruto do consumismo e, sobretudo, da falta de competência e de visão administrativa das autoridades políticas locais.

Em muitas destas sociedades ser proprietário de um veículo próprio está associado ao sucesso individual. Esta relação é ressaltada incansavelmente pela propaganda na mídia, o que quase obriga qualquer cidadão a comprar um carro, mesmo que não tenha condições para tanto e mesmo que o espaço físico onde vive não comporte mais um veículo sequer.

Infelizmente, este é o caso do Brasil, onde temos cerca de oito ou nove metrópoles com essas características. Foi justamente neste cenário que o governo brasileiro decidiu, no final de 2008, reduzir a carga tributária incidente no preço dos veículos de passeio e oferecer melhores condições de crédito para, segundo ele, preservar empregos e renda. Em princípio, nada errado com esta iniciativa. Entretanto, uma análise mais aprofundada da questão observando o quadro sob outro prisma torna evidente a inadequação desta medida. Cerca de 85% dos veículos saídos das fábricas têm como destino as grandes cidades.

Segundo dados da ANFAVEA (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), nos cinco primeiros meses de 2009 foram produzidos 1.186.973 veículos no país, sendo cerca de 1.009.000 destinados às grandes cidades, o que resulta num acréscimo de cerca de 6.800 novos veículos por dia nesses espaços urbanos (ver quadro abaixo).

Brasil - Produção Mensal de Veículos
  Janeiro
Fevereiro
Março Abril Maio TOTAL
Gasolina 19.501 25.044 26.872 28.575 30.990 130.982
Flex 151.553 163.523 228.381 206.177 217.339 966.973
Álcool
0 0 0 0 96 96
Diesel
13.995 15.812 19.623 18.986 20.506 88.922
Total
185.049 204.379 274.876 253.738 268.931 1.186.973
Fonte: ANFAVEA

O que já era um caos anteriormente – a movimentação urbana nessas metrópoles – agravou-se ainda mais, indicando a inadequação da solução governamental. Gerar ou preservar empregos é tarefa nobre, mas um governo criativo e preocupado em encontrar soluções inteligentes não seguiria por este caminho no qual estão patentes o imediatismo e a falta de planejamento.

Por uma questão acidental, o quadro da ANFAVEA mostra que cerca de 80% desses veículos são do tipo “flex”, isto é, podem ser movidos a álcool, gasolina ou qualquer porcentagem de mistura entre esses dois combustíveis. Além disso, os atuais preços do álcool tornam mais econômico o seu uso, fato que reduz as emissões de gases de efeito-estufa gerados pela combustão de derivados de petróleo.