A burrice de Belo Monte

Obra maior do PAC, a construção da hidrelétrica de Belo Monte, no rio Xingu, na região central do Pará tem tudo para produzir males em cadeia para sua região e para o país, sem falar na época em que se pretende iniciar sua construção.

    Para começo de conversa, a região escolhida para a barragem é habitada há séculos por comunidades indígenas. Belo Monte impactaria diretamente duas mil famílias na área urbana de Altamira, 813 na área rural de Vitória do Xingu e 400 famílias ribeirinhas. A Eletrobrás reconhece, ainda, segundo seu representante em Altamira, impactos diretos e indiretos sobre cerca de 10 comunidades indígenas, enquanto que antropólogos e pesquisadores falam em 14 comunidades.

    O principal obstáculo à construção é a Constituição Federal que obriga nestes casos que as comunidades indígenas envolvidas sejam ouvidas e que o Congresso Nacional se manifeste a respeito após auscultar as comunidades indígenas.

    Além dos impactos e burlas à Lei Maior do país, é muito fácil perceber os impactos sociais que uma obra deste porte vai trazer para a região. Belo Monte, se de fato construída, passaria a ser a terceira maior hidrelétrica do mundo, atrás apenas das de Três Gargantas, no rio Yang-Tse, na China e a de Itaipu, no rio Paraná. Algo deste tamanho, numa área como aquela, atrairia para a região dezenas de milhares de pessoas interessadas num emprego com as consequências naturais desse processo de migração desordenada – favelização, violência, tráfico de drogas, prostituição e subemprego, é claro.

    Uma outra questão que merece reflexão será o impacto da obra na floresta circunvizinha. Evidentemente, a represa e o lago formado por ela irão inundar uma vasta área da nossa Amazônia. Some-se a isto a destruição da floresta a ser causada pela chegada de cerca de 100 mil trabalhadores, alguns com suas famílias.

    Finalmente, nenhum de nós desconhece o papel das grandes empreiteiras de obras públicas no financiamento das campanhas eleitorais. E estamos em um ano eleitoral!

    A civilização do século 21 carece de um novo projeto no que diz respeito à energia. Estamos consumindo o sujo carvão mineral desde a Revolução Industrial. O não menos sujo petróleo ainda é motivo de guerras e atritos, mesmo estando provados os males que sua queima traz ao nosso meio ambiente. As imensas barragens e os enormes lagos artificiais resultantes de sua operação servem para produzir energia elétrica para grandes máquinas produzirem toneladas diárias de garrafas “pet” e outros tipos de detritos que estão a afogar nosso mundo. Recentemente, chegamos ao absurdo de um país do chamado Primeiro Mundo exportar sorrateiramente ainda alguns navios recheados de lixo urbano para os portos de Santos e Rio Grande no Brasil. Seria cômico se não fosse trágico.

    Isoladamente, alguns países mais sóbrios já começaram a alterar seu modelo de produção e uso da energia. Reconheceram que nosso tipo de civilização produz e desperdiça energia demais. Partiram para a educação em massa focalizando uma mudança de hábitos na produção e consumo de energia. Estão desenvolvendo o uso de energias alternativas e estimulando a locomoção de pessoas a pé ou em bicicletas.

    Há outros que estão desestimulando a produção de bens e serviços grandes consumidores de energia. Optaram pela produção de conhecimento ou, como se diz hoje em dia, de tecnologia. Enquanto isso, nós aqui, continuamos alagando nossas florestas...