Rumos do mundo islâmico

Cá da minha província, observo o mundo e processo as informações que me chegam dele pelos meios de comunicação. Se puder atuar em lugares distantes a favor das boas causas, valho-me da internet. Caso as questões estejam próximas de mim, procuro intervir pessoalmente dentro dos meus limites. Sei que não tenho poder para mudar radicalmente a realidade. Houve época em que eu me angustiava diante da minha impotência. Hoje, aceito-a de forma estóica e taoísta. Edgar Morin me ensinou a me proteger para continuar lutando, a reconhecer meus limites para não me desgastar.
Quanto à grande turbulência que agita o mundo islâmico, meu olhar antropológico divisa três tendências já expostas em artigos anteriores. A primeira é a contra-aculturação, um movimento que começou com a Irmandade Islâmica, continuou com a tomada do poder no Irã pelos aiatolás, foi adiante com o regime talebã, no Afeganistão e culminou com a ação da organização fundamentalista Al-Qaeda.
A segunda, de viés ocidental, é representada por regimes autoritários instalados em vários países islâmicos e apoiados pelo ocidente, em função de interesses econômicos. Sadam Hussein contou com apoio norte-americano na guerra entre Iraque e Irã. Depois, foi destronado pelos Estados Unidos. O regime talebã foi armado pelo ocidente na luta contra a invasão soviética do Afeganistão. Depois dos ataques da Al-Qaeda em 2001, forças ocidentais invadiram o Afeganistão para derrubar o governo que ajudaram a alcançar o poder.
A terceira tendência é representada pelos movimentos populares que protestam contra os regimes autoritários, tanto tempo amparados pelo ocidente e vistos com bons olhos por Israel. O apoio dado a eles por Estados Unidos e União Europeia sempre é suspeito. O conteúdo dos movimentos parece ser democrático, o que revela o grau de aculturação do Islã sem abdicar de todo do islamismo. A Turquia, a Indonésia e o Líbano demonstraram que é possível ter uma população religiosa e um governo laico ao mesmo tempo. Lamentavelmente, o Líbano retrocedeu em suas conquistas por interferência israelense e síria.
Agora, com o assassinato de Osama bin Laden por ordem de Barak Obama, novas questões se colocam. De longa data, o serviço de espionagem dos Estados Unidos procura o considerado terrorista número um do mundo, mas a glória por tê-lo encontrado coube a Obama. Ainda por um prisma antropológico, a ação norte-americana contrariou frontalmente os princípios da soberania nacional e dos direitos do homem, que o ocidente tanto cobra de outros povos. Primeiramente, por terem tropas de elite norte-americanas invadido o Paquistão, que aprendeu o que é soberania nacional. A organização Al-Qaeda tem uma concepção supranacional, e age em nome do Islã, não em nome de um país, como o IRA e a ETA. Seus atos violentos visam expurgar o mundo islâmico das influências ocidentais. Tanto assim que ela não hesita em atacar países muçulmanos. Mas as mortes de cidadãos não-ocidentais não têm o mesmo valor que a morte de cidadãos ocidentais. Os povos de regiões externas aos Estados Unidos e à Europa Ocidental são constituídos por cidadãos de 2ª e de 3ª classes.
Em segundo lugar, autoridades norte-americanas reconhecem que a tropa de elite não encontrou resistência ao invadir o esconderijo de Osama bin Laden. Não havia, portanto, motivo para matar todos. Pelo princípio ocidental dos direitos do homem, o correto seria prender seus ocupantes e levá-los a julgamento, ainda que fossem condenados à morte. Numa concepção sacralizada, como a da Al-Qaeda, ensina Mircea Eliade, antropólogo e historiador das religiões, a morte de um líder o transforma mais facilmente em mártir do que a morte de um líder laico.
A execução de Osama bin Laden, além de ilegal e de imoral, foi um erro estratégico. Obama cometeu o mesmo erro de Osama. Este, em acreditar que, com ações pontuais e violentas, é possível destruir um sistema. Aquele, em supor que, com a eliminação de um líder, elimina-se também o chamado terrorismo. O ato foi vingativo e eleitoreiro. O sangue das vítimas dos ataques às torres gêmeas não pode ser lavado com a execução do líder da Al-Qaeda. Com ela, Obama está de olho na reeleição, mas a tendência das pessoas é esquecer com rapidez.
De mais a mais, o movimento contra-aculturação de bin Laden está em queda diante dos movimentos populares que varrem os países árabes, já que eles almejam a instalação de regimes representativos e participativos, seja pela via pacífica, como ocorre no Egito, seja pela via da guerra civil, como na Líbia e talvez na Síria. A opção de bin Laden e dos regimes autoritários está sendo questionada pela opção democrática e, se bem sucedida em países fundamentais para o ocidente, pode virar todo o quadro geopolítico do Oriente Médio.

Folha da Manhã, Campos dos Goytacazes, 17 de maio de 2011

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