Para sair do Antropoceno

Normalmente, uma era, período e época geológica terminam com um grande abalo ambiental. A era paleozoica chegou ao fim com uma grande extinção que eliminou muitas espécies de árvores, 50% das famílias de animais, 95% de espécies marinhas, anfíbios, trilobites e a maior parte de briozoários e braquiópodes. Não se conhece devidamente ainda a causa ou as causas dessa crise. Mas, como na maioria delas, houve profundas mudanças climáticas, alterações nos oceanos e na água doce, alterações radicais dos ciclos naturais. Nenhum ser vivo foi autor dessa gigantesca hecatombe que abriu espaço para que os répteis prosperassem. Nenhum ser vivo tinha consciência para percebê-la e explicá-la. Eles simplesmente morreram ou se adaptaram aos novos tempos. Foi assim também com a crise no final do Mesozoico, que dizimou quase todos os grupos de répteis.
No caso do Pleistoceno, a crise foi mais moderada. A elevação natural da temperatura planetária produziu o derretimento de grandes geleiras. O nível dos oceanos subiu extraordinariamente, transformando em ilhas partes dos continentes. As mudanças climáticas levaram as florestas que cobriam o Saara a se transformarem em savanas, depois em estepes e finalmente num imenso deserto. Grandes espécies animais se extinguiram no hemisfério norte. Grandes mamíferos da América do Sul desapareceram. Talvez uma ou duas espécies de hominídeos deve ter chegado ao fim de sua história, restando apenas a nossa - o Homo sapiens sapiens. Vários grupos desta espécie foram obrigados a mudar de vida, com a invenção da agricultura e do pastoreio. Nascia, assim, o Holoceno, uma nova época geológica com temperaturas amenas. Por mais que, nos últimos 11 mil anos, o clima tenha sofrido algumas oscilações, ele permitiu a agropecuária, as cidades, a irrigação, a construção de impérios, a origem e o desenvolvimento do capitalismo e a revolução industrial.
Nos primórdios do Holoceno, não havia também consciência suficiente para explicar as grandes mudanças. A sobrevivência é que determinou as adaptações. Nos últimos 500 anos, o capitalismo estimulou a concorrência entre empresários e entre Estados. Ele comandou a expansão da Europa Ocidental pelo Oceano Atlântico e depois por todos os outros. Ele invadiu e dominou os demais continentes e ocidentalizou as diversas culturas do mundo. O padrão político dos Estados nacionais disseminou-se pelo mundo, bem como a concorrência capitalista e o socialismo, sistema que contestou o capitalismo, mas não rompeu o modelo do Estado nacional e da tecnologia.
Não houve, da parte do capitalismo e do socialismo, intenção de produzir uma crise ambiental planetária. Nos dois sistemas, acreditava-se que a natureza era infinita no fornecimento de matéria e energia e na absorção de resíduos. François Quesnay e Adam Smith, fundadores do liberalismo, sonhavam com uma sociedade mais justa a ser construída pela liberdade dos empresários e pela concorrência. Marx percebeu com clareza que o liberalismo aumentava as injustiças sociais e propôs o caminho do socialismo/comunismo para alcançar uma sociedade igualitária.
Acontece que a concorrência entre indivíduos e Estados começou a urdir uma nova contradição, a maior delas, entre os limites da Terra e o projeto de um crescimento ilimitado. Alguns pioneiros a perceberam e alertaram a humanidade sobre o seu perigo. Poucos lhes deram ouvidos. Ainda hoje, predomina o paradigma do crescimento ilimitado. Agora, porém, os sinais de uma nova crise global são mais eloquentes. Sucede que a maioria dos empresários, políticos e intelectuais continua apostando na Terra ou nem sequer acredita em crise. São os céticos.
O grande sinal da crise que pode nos levar a uma nova época geológica - o Antropoceno - é o aquecimento global. Contudo, em 2010, um grupo de 28 cientistas, tendo à frente o hidrólogo Johan Rockström, fundou o Centro Resiliência de Estocolmo. Pesquisando em várias frentes, os cientistas vêm mostrando que, em vez de apenas o aquecimento global, as condições ambientais do Holoceno sofrem mais oito ameaças, todas elas interagindo num sistema recursivo. Assim, a crise se retroalimenta. Rockström consolidou o conceito de espaço seguro de operação. Ultrapassados os limites do espaço de cada fator da crise, a reversão se torna difícil, mas não impossível. Vejamos o caso do esgarçamento da camada de ozônio: ela não voltou às condições do Holoceno, mas está havendo um retorno às condições originais.
Em termos geológicos, 200 anos pouco significam. Assim, estamos no começo do Antropoceno, uma fase geológica oriunda das atividades humanas coletivas. Há tempo para reverter os processos que podem nos levar não ao fim do mundo, mas a um mundo mais pobre em termos de condições ambientais e de aprofundamento da crise social. Muitas espécies se extinguirão, mas a vida continuará e a humanidade sobreviverá, embora em condições piores que as atuais. É possível ainda não entrar no antropoceno ou sair dele.
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