REVISITANDO CLARICE LISPECTOR

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“A palavra tem que se parecer com a palavra. Atingi-la é o meu primeiro dever para comigo. E a palavra não pode ser enfeitada e artisticamente vã, tem que ser apenas ela”.                


                                                      Clarice Lispector

“Decifra-me ou eu te devoro” é o desafio da cantadeira esfinge de Tebas e, também, dos textos de Clarice Lispector que ainda pulsam por aí. Passados trinta anos de sua morte (1977-2007) inúmeras leituras foram realizadas, mas todas, de alguma forma, revelam uma certa incompletude e muita indagação ainda por fazer.

Mas nenhuma leitura deixa de abordar suas metáforas insólitas, seu ato de desler o mundo, o viés de uma prática escritural que acompanha o simulacro do modo de escrever dessa autora, de uma busca incessante e prazerosa pela linguagem que não traduz nossas idéias, pelo indizível das palavras, pelo silêncio que significa e, por isso mesmo, diz muito mais.

Condenados pelo desejo e pelo prazer, os textos clariceanos, desde sua origem, conjugam mímese e prazer na sua poiésis, no surgimento mesmo da poesia. O texto, lido como fragmentos barthesianos, é processo vivo, é obra aberta, não se aprisiona e nem se deixa aprisionar ao espaço e, por isso mesmo, sua prosa se apresenta como epifania do ser. Compreende-se, então, nesse viés, que o texto é terra de ninguém e de todo mundo, lugar dinâmico e de (in)verdades, de efeito do real, segundo Barthes.

Seus textos, ao se fazerem, segundo o Prof. Roberto Correa dos Santos,  indicam o percurso de suas misérias e de suas perdas, a trajetória de seu trabalho, “ apontam em direção ao trabalho do corpo, sobre o corpo das coisas”. (1962, p.64). Talvez seja por isso que o próprio narrador em A Hora da Estrela  avisa: “ Juro que este livro é feito sem palavras. É uma fotografia muda. Este livro é um silêncio. Este livro é uma pergunta”.

Numa perspectiva semiológica, esse fragmento de A Hora da Estrela (último romance publicado pela autora) percorre caminhos que confirmam o registro icônico da palavra, símbolo por excelência da escritura-estrela de seus textos literários. Ler, esses textos, exige, de certa forma, um ritual semiótico em que a aproximação é sinônimo de reavivar a palavra no terreno mágico do mundo inusitado dos signos. O real se transfigura em mágicos símbolos que, por sua vez, pela percepção fugaz e instantânea se revertem em ícones pelo trabalho misterioso e místico num ritual chamado ficção.

E o que é a ficção de Clarice Lispector senão essa estranha sensação de que, dados os elementos na trama, algo vai acontecer? Momentos epifânicos? Revelações? Imprevistos? Ou a vida que se deixa ler à deriva, no seu fluxo do seu tempo?

Tudo isso foi debatido no delicioso encontro em Macaé nos dias 14 e 15 de maio no Centro Macaé de Cultura com a Professora Vilma Arêas da UNICAMP. O Evento intitulado AS VÁRIAS FACES DE CLARICE LISPECTOR descortinou várias máscaras, revelou outros discursos, abrilhantou várias mentes. Radiantes com a escritura que brilha feito estrela estiveram outros fãs e amantes de Clarice, como o Prof. Dr. Latuf Isaias Mucci da UFF, Prof. Haron, Luiz Guaracy e Rodrigo da FAFIMA e a idealizadora do encontro Ilcimar Santos. Do encontro, como na escritura de Clarice, ficaram várias promessas - entre elas - juras de amor eterno ao mundo da leitura e das significações – aliás, sempre flutuantes! Clarice Lispector nasceu no dia 10 de dezembro de 1920, em Tchetchelnik, na Ucrânia e morreu no dia 09 de dezembro de 1977 no Hospital do INSS da Lagoa no Rio de Janeiro. Meses antes foi publicado seu último romance A Hora da Estrela.