Quanto mais iminente a queda, maior a desfaçatez e ostentação das elites.

1324 A(s) histeria(s) da(s) crise(s)

Em tempos de bonança, as classes dominantes apregoam cinicamente que vivemos no melhor dos mundos. A própria burguesia, em sua infância revolucionária, nos idos do séc. 18, condenava os “excessos” da aristocracia e avocava para si os signos de equilíbrio, rigor e harmonia, cuja expressão estética mais conhecida foi a literatura árcade e a arte neoclássica em geral. Já em tempos de crise, não há lugar para o comedimento, como nos atesta o exuberante Barroco espanhol, síntese dos contrastes vividos pelo mundo ibérico após a unificação com os reis católicos Isabel e Fernando. Senhora formal de um império, mas empenhada nas mãos dos capitais estrangeiros, a monarquia viveu a tensão entre a miséria e a acumulação, o material e o espiritual, o lixo e o luxo… Não por acaso, tamanha inquietude iria gerar um dos símbolos mais notáveis de suas letras: o “conquistador” Don Juan, sublimação última talvez da depressão que se estenderia até a perda de Cuba e Filipinas em 1898.
Nascia o império de Tio Sam, ainda sob o reinado da Inglaterra, e o “curto” século 20 passaria a vivenciar ciclos cada vez mais imprevisíveis de crise e distensão, amplificados, por fim, pelo processo de globalização neoliberal e a atual etapa biocibernética de acumulação de capital. Em tempos tão “voláteis”, um clima de permanente histeria parece incorporar-se à vida pública cotidiana. Como já dissera o sábio Karl Marx, tudo que é sólido se dissolve no ar… – e o risco de mais um colapso do sistema capitalista nas matrizes (e periferia) do G7 parece anuviar o sono de muitos governantes.
Contudo, quanto mais iminente a queda, maior a desfaçatez e ostentação das elites. Até aqui, nesta venal Bruzundanga, os historiadores recordam o fausto e a mesa farta dos “coronéis” nordestinos, quando os engenhos de cana ficaram de “fogo morto” no limiar do séc. 20. Pois esse é o clima atual, após a crise financeira global deflagrada pela bolha imobiliária dos EUA e acirrada por insólitos eventos ao redor do planeta. Que o diga o bom-mulato Obama, já em plena campanha para a sucessão em 2012: como não pode sanar a astronômica dívida pública de Tio Sam, nem evitar a incursão voraz dos chineses nos mercados alheios, trata de alimentar a histeria doméstica (e, se possível, a europeia), anunciando em tom épico o assassinato (?) de Bin Laden, cujo corpo, em “respeito às tradições muçulmanas” (!), teria sido lançado ao mar em menos de 24 h. (Pano rápido…)
Que semana alucinada essa, meus caros leitores! Eu já tivera de suportar a overdose midiática de mais um casamento da realeza britânica (uma reedição modernosa do velho conto da carochinha, com o príncipe e a plebeia), coberto ao vivo pelas principais redes de TV, assim como o vertiginoso processo de beatificação do Papa João Paulo II pelo Vaticano. Isso sem falar na feérica sanha de invasão da Líbia, cujo roteiro foi (mal) escrito a várias mãos por Obama, Sarkozy, Cameron, Berlusconi & Cia. (pode-se ler CIA, sem problemas). É bem verdade que, após a entrada da OTAN em cena (o bom-mulato não gosta de sujar as mãos…), a aventura tornou-se um trágico pastelão e até a Igreja protestou contra o genocídio provocado pelos célebres bombardeios “cirúrgicos” da ‘Aliança Militar’, de triste memória na Iugoslávia.
Se não bastasse tanta arritmia, o próprio futebol padeceu as sequelas dessa onda. Falo do duelo entre Real e Barcelona: em meio à aguda crise da Espanha (com altíssima taxa de desemprego e risco enorme de bancarrota), os madrilenhos evocaram seu passado franquista contra a Catalunha (bastião da causa republicana) e, sob as ordens do arrogante português Mourinho, têm atuado em clima de ‘Guerra Civil’ (até a Globo, ávida por espetáculos, abriu espaço em sua sagrada “grade” para a peleja). Cá na terra de Noel, avesso a tamanha bulha, torço discretamente pelos catalães, que, embora não estejam imunes à histeria do capital (o futebol, antes de tudo, é um colossal negócio), jogam como um samba de Paulinho da Viola, tocando a bola, como o marujo “que durante o nevoeiro leva o barco devagar”…
* Luiz Ricardo Leitão é escritor e professor adjunto da UERJ. Doutor em Estudos Literários pela Universidade de La Habana, é autor de Noel Rosa – Poeta da Vila, Cronista do Brasil e Lima Barreto: o rebelde imprescindível.
** Publicado originalmente no site Brasil de Fato.
(Brasil de Fato)

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