Nações Unidas, 10/6/2014 – Quanto custa uma floresta? Qual é o valor econômico de um oceano? Pode-se pagar por uma floresta alpina ou uma pradaria glacial? Estes cálculos salvarão o planeta ou subordinarão a natureza às forças do mercado? A Organização Global de Legisladores para o Equilíbrio Ambiental (Globe International) divulgou no último dia de sua segunda Cúpula Mundial, realizada na semana passada na Cidade do México, um estudo sem precedentes sobre a contabilidade natural, que é a primeira compilação integral das iniciativas jurídicas e políticas de 21 países para calcular o valor monetário dos recursos naturais.
“O estudo sobre e legislação climática da Globe” define como “capital natural” tudo o que inclua os ecossistemas, a energia solar, as jazidas minerais e os combustíveis fósseis, entre outras coisas. Reconhece o impacto degradante da atividade humana para o ambiente e destaca a “urgente necessidade de desenvolver métodos e medidas eficazes para contabilizar o capital natural, e de incorporá-los aos marcos legais e de política pertinentes”.
“O informe foi concebido em grande parte como uma associação de aprendizagem Norte-Sul”, explicou o destacado cientista Ben Milligan, pesquisador do Centro de Direito e Meio Ambiente da Universidade College, de Londres. “Foi dada igualdade de voz a todos os aportes”, explicou à IPS, fossem da Secretaria Internacional da Globe ou dos 21 grupos dos países incluídos, dos quais cinco da Ásia, três da Europa, sete da África e seis da América.
Segundo Milligan, os autores descobriram que existe um alto apoio político ao reconhecimento de que, “além dos importantes valores culturais, espirituais e estéticos da natureza, esta também proporciona bens e serviços essenciais para nosso bem-estar e existência econômica”. O informe inclui conclusões alarmantes. No Peru, por exemplo, onde o enfoque das contas de capital natural se vincula à avaliação econômica, o Ministério do Ambiente comprovou que “o valor total dos serviços dos ecossistemas selecionados em 2009 chega a US$ 15,3 bilhões”.
Detalhado, isto representa US$ 2,5 bilhões procedentes da água e da energia, US$ 8 bilhões da agricultura, silvicultura e pecuária, e US$ 864 milhões da pesca, enquanto as exportações de capitais naturais geraram US$ 9 milhões em 2009. “Os serviços dos ecossistemas são a base produtiva de setores como pesca, agricultura, manufatura, turismo e indústria farmacêutica” do Peru, segundo o informe. O governo já utiliza várias ferramentas para medir a saúde do ambiente, inclusive o informe anual Estado do Meio Ambiente, redigido pelo Sistema Nacional de Informação Ambiental.
Na República Democrática do Congo (RDC) sabe-se que uma extensa rede de lagos e rios cobre 3,5% da superfície total do país, enquanto as florestas, que abrigam mais de 700 espécies identificadas de árvores, representam 60% da área nacional. O setor florestal gera 2% do produto interno bruto (PIB). O Banco Central angolano estima que as indústrias extrativistas contribuíram com 45% do PIB em 2010, e a contribuição da mineração foi de aproximadamente 34%.
O governo procura fortalecer o marco legal e regulatório do setor. Assim, realiza pesquisa geológica e mineral para ampliar seu conhecimento do solo e subsolo, e avaliações ambientais do impacto da mineração. Os defensores da contabilidade do capital natural afirmam que o sistema vai modelar o comportamento do governo e fomentar o uso sustentável dos recursos, enquanto outros alertam que o cálculo da “riqueza natural” é mais um passo para a mercantilização completa do planeta.
“A avaliação dos serviços e das funções ecológicas da natureza pode funcionar nos dois sentidos”, pontuou à IPS outra das autoras do estudo, Vandana Shiva, ecologista e criadora da Fundação de Pesquisa sobre Ciência, Tecnologia e Ecologia da Índia. Compreender o valor que têm os ecossistemas estáveis e sãos é “necessário e bom”, afirmou. “Mas, no momento em que se toma um sistema complexo com numerosas funções e o reduzimos a uma só função que pode ser apropriada e comercializada, já estamos falhando. Afinal, a moeda da vida é a vida, não o dinheiro”, ressaltou.
Shiva se referiu à Cúpula dos Povos realizada em paralelo às negociações de alto nível da conferência do meio ambiente no Brasil em 2012 (Rio+20). Na ocasião, ativistas, grupos indígenas e cientistas rechaçaram a ideia de uma economia verde baseada na “financiarização” dos serviços ecológicos, pelo medo de que se ignore as causas básicas da destruição ambiental.
Uttarakhand, um Estado do norte da Índia, oferece um claro exemplo desse debate, já que recentemente se converteu no primeiro Estado indiano a calcular seu produto ambiental bruto. Com seus exuberantes vales e suas pradarias alpinas, este Estado do Himalaia é um dos mais verdes da Índia, e conserva quase 60% de suas florestas, apesar dos decididos esforços para limpar a terra e destiná-la à construção.
O estudo da Globe International diz que vários relatórios avaliam a terra de Uttarakhand em cerca de US$ 5 bilhões a US$ 7 bilhões ao ano. O governo ofereceu ao Estado um “subsídio ecológico” de US$ 300 milhões por ano em troca de preservar a riqueza de sua terra. Shiva afirmou que o subsídio serve apenas para desviar a atenção de problemas mais graves, como o desmatamento e o derretimento das geleiras nesse Estado, que provocaram graves inundações em 2013.
A Suprema Corte da Índia reconheceu que as represas e os projetos hidrelétricos agravaram o trágico desastre na área. Isso demonstra que “a valorização é boa se mostrar uma luz vermelha para a destruição. Mas quando a valorização se converte em um preço, apenas oferece uma luz verde para destruir de maneira mais inteligente”, ressaltou Shiva. Outros temem que a contabilidade do capital natural pisoteie os direitos dos indígenas.
Para Hugo Blanco, dirigente da Confederação Camponesa do Peru, a tabulação da “riqueza natural” de um país não corrigirá a pirâmide do poder que coloca as empresas transnacionais em cima e a população indígena e o ambiente na base. “Um exemplo é o projeto Conga”, apontou à IPS, se referindo à iniciativa de mineração de ouro e cobre na região peruana de Cajamarca, que ameaça envenenar a água de 40 lagoas de alta montanha, que, por sua vez, abastecem cerca de 600 aquíferos e fornecem água potável e para irrigação a milhares de camponeses, antes de fluir para os cinco grandes rios que desembocam nos oceanos Atlântico e Pacífico.
E, alerta Blanco, o pior é a ameaça da construção de uma represa que, se acontecer, inundará o território de centenas de camponeses com a finalidade de fornecer eletricidade para a mina. “Esse é um sistema de loucos”, ressaltou. Esses projetos revelam o real compromisso do governo peruano, não com as leis nacionais que protegem os direitos dos povos indígenas ou o ambiente, mas com as multinacionais, afirmou.
Blanco acredita que seu país é um perfeito exemplo das deficiências inerentes ao sistema de valorização que fixa um preço à natureza. O Peru é um dos dez países megadiversos do planeta, segundo o Convênio sobre a Diversidade Biológica, e ocupa o primeiro lugar em quantidade de espécies de peixes (mais de duas mil), o segundo em aves (1.736) e o terceiro em anfíbios (322). “Seria uma grande estupidez vender essa riqueza, não importa quantos milhares de milhões de dólares se possa obter. Não podemos vender a vida”, enfatizou.

Democracia da Terra
O estudo da Globe International indica que a Índia conta com 2,4% da superfície terrestre do planeta, mas abriga de 7% a 8% de suas espécies de fauna e flora. Além disso, é um dos 17 países megadiversos, com três zonas de forte biodiversidade e alta taxa de endemismo das espécies. Ao se referir à obra da Navdanya, uma organização que significa “nove sementes” e que surgiu da Fundação de Pesquisa em Ciência, Tecnologia e Ecologia, Vandana Shiva falou dos esforços que são realizados na Índia para conservar a natureza sem recorrer à linguagem do dinheiro.
Integrada por poupadores de sementes e produtores orgânicos em mais de 17 Estados, a Navdanya criou 11 bancos de sementes comunitários, formou cerca de 500 mil camponeses em agricultura sustentável e compôs a maior rede ecológica de comércio justo no país. “Se o sistema globalizado baseado nas matérias-primas e a “financiarização” reduzem a base social e ecológica da comunidade, o trabalho da Navdanya a aumenta e melhora”, garantiu Shiva à IPS.
Em torno do conceito de Democracia da Terra, a Navdanya oferece aos agricultores uma alternativa ao sistema de cultivo comercial, que provocou uma onda de suicídios sem precedentes na história. “Democracia da Terra significa que nenhum sistema pode reduzir-se a uma simples função ou produto que se comercializa no mercado mundial”, explicou Shiva. Há quem “se dê conta de que os solos absorvem carbono, e querem reduzir essa função a uma equação entre o carbono e o comércio, sem se preocupar com o fato de o solo não ser apenas carbono, mas também fósforo, magnésio e muitas coisas mais que não se pode atribuir um simples valor monetário”, concluiu a ecologista. Envolverde/IPS

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