A parceria estabelecida há cinco anos entre o Ministério da Saúde e o Centro de Teatro do Oprimido para capacitação de profissionais da saúde mental do SUS nas técnicas do Teatro do Oprimido, com objetivos terapêuticos, vem propiciar uma relação mais humana entre portadores do sofrimento psíquico, seus familiares e os profissionais do SUS. Desde que o teatro entrou na vida destas pessoas os períodos de internação e de depressão diminuíram, a adesão ao tratamento aumentou, o consumo de drogas (medicação) baixou e a vontade de viver ressurgiu. Até hoje, mais de 170 profissionais já foram capacitados.
17 milhões de pessoas sofrem de transtorno mental, somente no Brasil

Segundo pesquisa recente da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), 17 milhões de pessoas, ou 9% da população brasileira, sofrem de transtorno mental grave. Os mais acometidos por essas doenças são os indivíduos de classe social baixa, pouca escolaridade e moradores das periferias das cidades. E ainda: 12,6% dos brasileiros entre 6 e 17 anos já apresentam sintomas de transtornos mentais importantes. Isso equivale a dizer que cerca de 5 milhões de crianças e adolescentes sofrem de algum distúrbio psicológico. Deste total, aproximadamente 3 milhões têm sinais de Transtorno de déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), o transtorno psicológico mais frequente na garotada. Já a Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que os distúrbios do humor afetem cerca de 20% da população mundial e a cada ano são registrados 2 milhões de novos casos. Em 2020, a depressão será o principal transtorno mental a atingir moradores dos países em desenvolvimento, como o Brasil.

“Aquele remédio do teatro”

A psicopedagoga Cláudia Simone, Curinga do Centro de Teatro do Oprimido, conta que um dia um sujeito interrompeu o ensaio de um grupo de Teatro do Oprimido, que acontecia no Hospital Psiquiátrico de Jurujuba, e pediu para tomar “aquele remédio do teatro”, para melhorar como os outros e não ter mais que ficar internado.

Muitas coisas não conseguem ser expressas somente com a palavra, numa conversa ou terapia, é preciso usar o corpo, a imagem e o som. E é isso que o Teatro do Oprimido oferece. A teatralização de um problema, pelas técnicas do Teatro do Oprimido, cria um distanciamento que permite aos participantes (atores e espectadores) observarem o que de fato está acontecendo. Vestindo um figurino, utilizando-se de uma cenografia, música e dramaturgia, o usuário e o profissional da saúde mental, agora atores, protagonistas de suas histórias, podem transmitir o que a simples conversa não é capaz de comunicar. Assim, a possibilidade de transitar entre vários personagens no palco, ora sendo usuário, ora sendo médico, ora sendo filho, filha, pai ou mãe, permite que eles se vejam de outra maneira e sejam vistos de outra forma também, minimizando o estigma da doença mental e trazendo a questão dos direitos humanos para a sociedade.

– É importante considerar a questão do Teatro do Oprimido como possibilidade de uma metodologia artística que proporciona o diálogo. Um exemplo é que atualmente os CAPS vêm utilizando o Teatro do Oprimido nas suas assembléias (reuniões que reúnem os usuários, seus familiares e profissionais dos CAPS) onde muitas vezes não se conseguia falar coisas que foram ditas e trabalhadas através da imagem, do teatro. E isso é uma importante forma de resultado a se considerar – afirma o sociólogo Geo Britto, coordenador do projeto Teatro do Oprimido na Saúde Mental e Curinga do Centro de Teatro do Oprimido.

O Teatro do Oprimido não apresenta respostas, mas procura fazer as perguntas certas. E uma das principais perguntas na relação entre usuários, seus familiares, os profissionais da saúde mental (vou mais além: na sociedade como um todo) é O QUE FAZER? É importante considerar que os usuários também têm problemas de transporte, alimentação, desemprego, racismo, sexismo, corrupção, etc. Através do teatro, da encenação de um problema ou conflito, pode-se chegar a um entendimento das condições dos protagonistas. Através do teatro começa a existir uma nova relação, mais humana, entre usuários e profissionais da saúde mental. O diferente é igual a gente.

– Num contexto onde tentam esconder o diferente, o Teatro do Oprimido vem estimulando a sua visibilidade como cidadão e agente transformador de sua própria história. O diferente sobe no palco, conta sua história, vê e é visto por todos sem negar a sua condição de usuário, porém sem se sentir inferior mais semelhante com sua diferença – destaca Cláudia Simone.

O teatro muda tudo, porque os diferentes voltam a se sentir como parte da sociedade. Desde que o teatro entrou na vida destas pessoas com transtornos psiquiátricos, os períodos de internação e de depressão diminuíram, a adesão ao tratamento aumentou, o consumo de drogas (medicação) baixou e a vontade de viver ressurgiu. Isso é uma constatação.

Teatro do Oprimido na Saúde Mental


“O único lugar no Brasil que tem prisão perpétua é o manicômio judiciário.” (x, 53 anos, presidiária)

A troca de experiências entre o Teatro do Oprimido e a Saúde Mental não é recente, nem restrita ao território nacional. Desde os anos 80, na França, em Cherbourg, profissionais desta área trabalham com as técnicas do Teatro do Oprimido. O mesmo acontece em Bradford, Salford e Hebden Bridge na Inglaterra. Em 2004, em contato com a Coordenação Nacional de Saúde Mental, através do Dr. Pedro Gabriel Delgado, foi aprovado um projeto piloto para trabalhar as técnicas do Teatro do Oprimido com portadores do sofrimento psíquico e profissionais da saúde mental, inicialmente no Rio de Janeiro e depois ampliado para São Paulo.

A partir de 2008 (até 2010) o projeto Teatro do Oprimido na Saúde Mental, patrocinado pelo Ministério da Saúde por intermédio do Fundo Nacional de Saúde, atua nos Centros de Atenção Psicossociais - CAPS e Unidades Básicas de Saúde - UBS dos estados (pólos) de Sergipe, Rio de Janeiro e São Paulo. Nestes anos já foram capacitados mais de 170 profissionais da saúde mental do SUS que estão trabalhando com as técnicas do Teatro do Oprimido em benefício dos portadores do sofrimento psíquico. O objetivo para os próximos meses é capacitar outros 50 profissionais, nos três pólos.

Quando se fala em profissionais da saúde mental, pensa-se nos médicos, enfermeiros e psicólogos, mas não apenas estes são capacitados e também beneficiados com as técnicas do Teatro do Oprimido, também os técnicos em enfermagem, seguranças, porteiros, pessoal da limpeza e cozinha, músico terapeutas, terapeutas ocupacionais, ou seja, todos aqueles que têm maior ou menor contato com os usuários dos CAPS e seus familiares.

A eficácia do Teatro do Oprimido na Saúde Mental se dá justamente porque todos participam.

“Mas cadê o resultado?”


Segundo Augusto Boal, teatrólogo e criador do Teatro do Oprimido, o que se busca neste trabalho é desenvolver as capacidades estéticas que todos os indivíduos têm, com o objetivo de que eles analisem os problemas do presente, usando a experiência do passado, para inventar o futuro.

– Numa sociedade em que se procura excluir o diferente, inventar o futuro é mais do que necessário. Nós temos medo dos diferentes, mas quando a gente se olha no espelho e diz “este sou eu”, está dizendo que é diferente. Portanto, diferentes somos todos nós. Por isso, sentimos medo e angústia com a exclusão daqueles diferentes que são tão semelhantes a nós mesmos – afirma Augusto Boal.

– A gente trabalha sobre a possível superposição entre o delírio patológico e o delírio artístico, e o uso dos ritmos na criação de diálogos e de estruturas sociais. O teatro em geral já é uma forma delirante de arte. A gente já fez algumas experiências muito lindas. Às vezes as pessoas perguntam: “Mas cadê o resultado?”. O resultado é que em muitos desses CAPS que a gente trabalha o consumo de drogas (medicação) tem reduzido. O teatro não cura, tranquiliza e dá mais um pouco de felicidade para as pessoas, para não ficarem tão angustiadas – conclui Boal.


Ney Motta | Centro de Teatro do Oprimido 
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